Gabriela Ferraz Granja concluiu seu mestrado em teoria literária no ano passado, na Unicamp, com a dissertação intitulada “Um Fim à Escuridão: Formalizações e Ficcionalizações do Mal e da Guerra em ‘O Senhor Dos Anéis’, de J.R.R. Tolkien”.
Agora, ela busca apoio coletivo via Benfeitoria para a publicação do seu livro, em formato digital e impresso. Como é praxe nas campanhas de apoio coletivos, a ação oferece vários tipos de oferta e respectivos benefícios. A campanha “tudo ou nada” vai até 3 de julho, e a data de publicação do livro está prevista para novembro deste ano.
Confira o relato de Gabriela, sobre sua experiência em literatura tolkieniana.
Gabriela Ferraz Granja
Eu nasci e cresci cercada por histórias. Venho de uma família que as adora, sejam elas do cancioneiro oral, declamadas na voz de minha avó, sejam do colo materno, orações cantadas por minha mãe, sejam do mundo erudito, que vinham até mim nas leituras de minha irmã — mulheres de grandes saberes, essas. Elas contam os mistérios do mundo passado, os do mundo presente, muitas vezes, até a minha própria história.
O alcance dessas narrativas foi tamanho que eu cresci para me tornar uma grande leitora. Devoro literatura desde muito nova e me tornei, enfim — e como minha avó, mãe e irmã — eu mesma uma contadora de histórias. Não me desvencilho das narrativas nunca, sempre encontro motivos para colocá-las diante das pessoas.
Houve um momento em que meu sonho era justamente ser o que sou agora: uma estudiosa das histórias. Foi então que uma das mais incríveis delas entrou em foco: deparei-me, aos 14 anos, com O Senhor dos Anéis. Por coincidência — ou não — foi nessa idade que decidi me tornar professora, o que me levou ao caminho que percorri nas duas décadas de vida que se seguiram. A identificação foi imediata: a luta contra o mal, mesmo sem a posse de grandes poderes, era justamente a história que brilhava em meus olhos naquele momento e que brilharia por anos, até que, enfim, eu tivesse a oportunidade de estudar não só muitas histórias — eu gostaria de conhecer todas as que existiam no mundo —, mas essa em especial.
O texto longuíssimo, as lindas e as terríveis paisagens, os heroicos e os não tão heroicos personagens, os seres macabros, enfim, a narrativa sobre amizade e maldade, medo e coragem, cresceu nos meus afetos e, por algum tempo, para mim, nenhuma a superava em emoção. Passei a ter um grande orgulho por estudar uma obra tão conhecida, tão estrondosa quanto O Senhor dos Anéis.
Contudo, os desafios — entendi então que eles também existem na vida real — foram intensos. Primeiro, veio a necessidade de provar para todos ao meu redor que aquilo que eu estudava — enfim, histórias — era muito importante, mas me faltavam meios e ferramentas para tanto. O caminho foi se abrindo diante de mim: argumentos foram encontrados; afinal, mestre Tolkien poderia ter se baseado nos contos maravilhosos para escrever sua narrativa tão convidativa à leitura. O trabalho foi feito, e uma nova perspectiva de continuidade se desenhou: o estudo do mal e da guerra.
Eu nem mesmo podia imaginar os perigos que viriam na curva do caminho: meus afetos ficaram doentes e entrei em uma paralisia psíquica que me cegou, impedindo-me de ver cores em tudo, inclusive em O Senhor dos Anéis. Foram tempos tenebrosos, de muito medo e de um grande esforço para vencer o mal letárgico que me acometia.
A história entrou em outro foco, então: um que me levava para o lugar da vida adulta, em que entendemos que as tristezas e temores são parte do existir. O que ficou é a certeza de que é necessário continuar, ir adiante e, se com medo, ir com medo mesmo. Guimarães Rosa diz — e eu passei a concordar — que “o correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois de desinquieta. O que ela quer da gente é coragem.”
Com coragem, segui. Daí passei a me pensar juntamente com a história de O Senhor dos Anéis. Foi como um clic. Debrucei-me, então, sobre os motivos de eu — e de uma grande legião de leitores e de fãs — ter apreciado tanto essa história. Disso, veio minha qualificação e, logo, alguma certeza de que eu era capaz de sair da sombra e de continuar a escrever e pensar sobre histórias.
Foi quando as cartas de Freud e de Einstein vieram parar em minhas mãos que tive imenso incentivo para seguir com o trabalho. Ali se discutia o porquê da guerra, pergunta que eu mesma sempre me fiz e cuja resposta procurei em minhas leituras e pesquisas. Percebi, então, que, como Tolkien e nas palavras de Freud, eu era pacifista! e isso passou a nortear imensamente minha escrita e minha atuação no mundo como indivíduo.
Depois, tinha diante de mim a discussão muito complexa acerca do mal e, portanto, do bem, e preferi desenvolvê-la por meio dos personagens que mais me inspiravam. É o caso de Éowyn, que me despertou a certeza de que mulheres podem tudo, inclusive aniquilar o mais terrível dos inimigos. É o caso de Frodo, que persiste, insiste, continua, mesmo em face do mal. É o caso de Sméagol, que procura, em seu torturado ser, a bondade e a amizade. É o caso de Boromir, que se arrepende do mal, feito por ele, e que se torna, por isso mesmo, um herói.
Minha trajetória com O Senhor dos Anéis me parece de uma coerência tamanha que me traz alívio e orgulho ter empreendido esse caminho. A grande aventura que foi escrever esse livro, eu levo como uma joia preciosa junto ao peito, que bate por novos perigos, novos afetos, novos vislumbres de lugares terríveis e incríveis. Pretendo, por fim, continuar sendo Gabriela. Lá e de volta e outra vez e sempre.
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